Também em processo de reedição em vários países da Europa, a minha recomendação para esta semana vai para aquele que é, na minha opinião, o melhor romance de Robert Wilson: “O Cego de Sevilha”.
A obra impressiona não apenas pela componente policial extremamente realista e complexa (toda a narrativa de desenrola a partir do assassinato macabro de Raúl Jimenez, famoso empresário sevilhano e um dos homens mais ricos – e perversos – do sul de Espanha) mas pelo verdadeiro thriller psicológico que se adensa à medida que o Inspector encarregue do caso – o famoso Inspector Fálcon – procura desvendar aquele circuito macabro de acontecimentos.
Desde a prostituta Eloisa à jovem mulher de Raúl Jimenez – Consuelo Jimenez – o “Cego de Sevilha” mergulha o leitor numa fascinante viagem ao interior das múltiplas histórias e dos múltiplos passados das personagens envolvidas, provocando uma espécie de tic-tac emocional que torna difícil desprendermo-nos da obra antes da última página.
O que torna esta obra, na minha opinião, verdadeiramente épica, é a conjugação heroica da tentativa de Fálcon para desvendar este crime diabólico – alguém cortou as pálpebras a Raúl Jimenez e o obrigou a assistir a um vídeo – com uma deliciosa descida histórica ao inferno da guerra civil espanhola e das legiões nacionalistas, através do diário do pai de Fálcon, um pintor famosíssimo que oscilou, no entanto, entre a lucidez e a loucura permanentes.
Desde os suspeitos habituais, às banais conversas institucionais entre o juiz e os órgãos de polícia encarregues do caso, tudo na obra de Wilson se torna denso, complexo, arrepiante. Na linguagem riquíssima deste “O Cego de Sevilha” até as noites do Inspector Fálcon se tornam num verdadeiro memorial literário, digno de comparação às narrativas descritivas de Hemingway ou Thomas Mann.
E, finalmente, as lições que ficam. Se o assassino de Raúl quer apenas dar uma lição aos pervertidos e corruptos deste mundo; se Fálcon quer dar uma lição aos criminosos do nosso planeta; se o seu pai queria dar uma lição aos “comunistas” e aos “vermelhos” que não compreendiam a natureza humana…então temos de concluir que Robert Wilson nos dá também, com “O Cego de Sevilha”, uma lição brutal: nada de tirar conclusões antes do cair do pano.

André Ventura
Escritor
Professor Universitário